Por Urariano Motta,
escritor e jornalista (*)
Na vitória de Barack Obama há um aspecto original que não vem sendo notado. "Há muitos aspectos, colunista apressado", poderia ser dito. Tentarei explicar.
Além do mais claro, quero dizer, além do fato mais óbvio, de Obama ser o primeiro negro eleito para a presidência dos Estados Unidos, me chama atenção que na sua vida há uma vitória sem ruído de pessoas "derrotadas", ou marginalizadas na cultura da sociedade norte-americana. Para ser mais preciso, na sua vitória há uma vitória
muito especial da sua mãe.
A mãe de Obama, Stanley Ann Dunham, foi uma pessoa rara já a partir do nome com que foi batizada. O pai queria um filho homem, e se compensou, ou se vingou, impondo-lhe um nome de homem. Para quê? O bom da vida são as limonadas que fazemos dos limões que nos atiram.
Stanley Ann, para a sociedade americana em 1960, não demorou a mostrar a que veio. Aos 18 anos, conheceu o negro Barack Hussein Obama na Universidade do Havaí, em uma aula de... russo! Branca, namorou o jovem queniano, casou... queremos dizer, juntou suas roupas e livros às dele, e teve Barack Hussein Obama Jr.
Como a estabilidade não era bem o seu ideal, separou-se poucos anos depois. Em 1964, ainda irrecuperável, Stanley Ann voltou à faculdade para se formar e casar à sua maneira mais uma vez: uniu-se a um estrangeiro não-branco, o indonésio Lolo Soetoro.
Stanley Ann era não só diferente, rebelde, por intuição. Antropóloga, escreveu uma dissertação de 800 páginas sobre os trabalhos de serralheria dos camponeses de Java. Trabalhando para a Fundação Ford, defendeu o direito das mulheres trabalhadoras e ajudou a criar um sistema de microcréditos para os pobres.
Maya Soetoro-Ng, a meia-irmã de Obama, afirmou recentemente sobre a mãe: "essa era basicamente a sua filosofia de vida; não nos limitarmos por medo de definições estreitas, não erguermos muros à nossa volta e nos empenharmos ao máximo para encontrarmos a afinidade e a beleza em locais inesperados".
Stanley Ann Dunham morreu de câncer no ovário em 1995. O pai, a quem Obama dedicara um livro, ele mal viu, depois dos dois anos de idade. Por isso afirmou, o primeiro homem negro eleito para a presidência dos Estados Unidos: "eu creio que se eu soubesse que a minha mãe não iria sobreviver à doença, eu escreveria um livro diferente - menos
meditação sobre o pai ausente, mais celebração da mãe que era a única coisa constante em minha vida", escreveu no prefácio de suas memórias, "Sonhos De Meu Pai".
E acrescentou: "eu sei que ela era a mais gentil, o espírito mais generoso que já conheci e o que existe de melhor em mim eu devo a ela". Para essa Ann, mulher estranha para os valores dominantes, delicada e rebelde, na campanha eleitoral Obama chamava de a sua "mãe solteira". O presidente eleito não repete, é claro, o pensamento, os atos e as convicções da mãe. Se assim fosse, não teria chegado aonde chegou. Mas sem as idéias de Stanley Ann Dunham, Barack Hussein Obama Jr. não teria tido a mais remota possibilidade de existir.
Em lugar do "sonho americano", que toda imprensa proclama, Obama é antes uma vitória do pensamento e de idéias não-conservadoras, que estavam no limite dos marginalizados hippies.
E os hippies, vocês lembram, naqueles malditos tempos acabavam nas prisões, ou como em Easy Rider, sob tiros de espingarda.
Em 2008, um filho de mãe solteira, de uma irrecuperável, é eleito presidente. Para essa nova história, somente espero não ser um colunista muito apressado.
(*) Artigo originalmente publicado no site Direto da Redação, editado em Miami.
escritor e jornalista (*)
Na vitória de Barack Obama há um aspecto original que não vem sendo notado. "Há muitos aspectos, colunista apressado", poderia ser dito. Tentarei explicar.
Além do mais claro, quero dizer, além do fato mais óbvio, de Obama ser o primeiro negro eleito para a presidência dos Estados Unidos, me chama atenção que na sua vida há uma vitória sem ruído de pessoas "derrotadas", ou marginalizadas na cultura da sociedade norte-americana. Para ser mais preciso, na sua vitória há uma vitória
muito especial da sua mãe.
A mãe de Obama, Stanley Ann Dunham, foi uma pessoa rara já a partir do nome com que foi batizada. O pai queria um filho homem, e se compensou, ou se vingou, impondo-lhe um nome de homem. Para quê? O bom da vida são as limonadas que fazemos dos limões que nos atiram.
Stanley Ann, para a sociedade americana em 1960, não demorou a mostrar a que veio. Aos 18 anos, conheceu o negro Barack Hussein Obama na Universidade do Havaí, em uma aula de... russo! Branca, namorou o jovem queniano, casou... queremos dizer, juntou suas roupas e livros às dele, e teve Barack Hussein Obama Jr.
Como a estabilidade não era bem o seu ideal, separou-se poucos anos depois. Em 1964, ainda irrecuperável, Stanley Ann voltou à faculdade para se formar e casar à sua maneira mais uma vez: uniu-se a um estrangeiro não-branco, o indonésio Lolo Soetoro.
Stanley Ann era não só diferente, rebelde, por intuição. Antropóloga, escreveu uma dissertação de 800 páginas sobre os trabalhos de serralheria dos camponeses de Java. Trabalhando para a Fundação Ford, defendeu o direito das mulheres trabalhadoras e ajudou a criar um sistema de microcréditos para os pobres.
Maya Soetoro-Ng, a meia-irmã de Obama, afirmou recentemente sobre a mãe: "essa era basicamente a sua filosofia de vida; não nos limitarmos por medo de definições estreitas, não erguermos muros à nossa volta e nos empenharmos ao máximo para encontrarmos a afinidade e a beleza em locais inesperados".
Stanley Ann Dunham morreu de câncer no ovário em 1995. O pai, a quem Obama dedicara um livro, ele mal viu, depois dos dois anos de idade. Por isso afirmou, o primeiro homem negro eleito para a presidência dos Estados Unidos: "eu creio que se eu soubesse que a minha mãe não iria sobreviver à doença, eu escreveria um livro diferente - menos
meditação sobre o pai ausente, mais celebração da mãe que era a única coisa constante em minha vida", escreveu no prefácio de suas memórias, "Sonhos De Meu Pai".
E acrescentou: "eu sei que ela era a mais gentil, o espírito mais generoso que já conheci e o que existe de melhor em mim eu devo a ela". Para essa Ann, mulher estranha para os valores dominantes, delicada e rebelde, na campanha eleitoral Obama chamava de a sua "mãe solteira". O presidente eleito não repete, é claro, o pensamento, os atos e as convicções da mãe. Se assim fosse, não teria chegado aonde chegou. Mas sem as idéias de Stanley Ann Dunham, Barack Hussein Obama Jr. não teria tido a mais remota possibilidade de existir.
Em lugar do "sonho americano", que toda imprensa proclama, Obama é antes uma vitória do pensamento e de idéias não-conservadoras, que estavam no limite dos marginalizados hippies.
E os hippies, vocês lembram, naqueles malditos tempos acabavam nas prisões, ou como em Easy Rider, sob tiros de espingarda.
Em 2008, um filho de mãe solteira, de uma irrecuperável, é eleito presidente. Para essa nova história, somente espero não ser um colunista muito apressado.
(*) Artigo originalmente publicado no site Direto da Redação, editado em Miami.
Um comentário:
Muito interessante...
Espero que não nos decepcionemos...
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